SILVIA ADERNE E SUA ARTE DE MUITAS MÃOS


POR ANDREA CARVALHO STARK *


De repente, todo mundo começou a falar de Silvia Aderne. Silvia é uma das atrizes brasileiras escolhidas para integrar o elenco do renomado Cirque Du Soleil. Mas ela não é nova nessa carreira. Sílvia é atriz desde 1963. É uma das criadoras do Hombu (palavra do dialeto kraó que significa "venha nos ver"), um grupo de teatro que há 28 anos trabalha especialmente para crianças.




As crianças não estão na vida de Silvia somente quando a atriz começou sua carreira no teatro. Antes disso, ela era professora para classes de alfabetização, e trabalhava com contação de histórias:


"Em 1962 vim para o Rio de Janeiro para fazer o Curso Intensivo de Arte na Educação, para professores, na Escolinha de Arte do Brasil, onde poderia me aperfeiçoar, conhecer novas pessoas, novas formas de fazer o que já fazia lá em Minas. Enfim, abrir os meus horizontes. E realmente meus olhos se abriram para muitas coisas. Foi aí que eu comecei a fazer teatro com crianças: Teatro de Mãos, Teatro de Pés, Teatro de Silhueta, Teatro de sombra, Teatro de Luvas. Lá eu aprendi a fazer muitos tipos de bonecos e foram eles os grandes responsáveis por eu fazer teatro".

Depois do curso, ela passou a integrar o grupo de Ilo Krueger e Pedro Domingues e começou a viajar o Brasil, nos anos sessenta. O grupo Hombu foi criado após a ida de Ilo para São Paulo, em janeiro de 1977.

O Hombu era Regina Linhares, Beto Coimbra, Sérgio Fidalgo, Tarcisio Ortiz e Silvia Aderne. Seu primeiro trabalho: "A Gaiola de Avatsiú". Com esse espetáculo, eles conquistaram o prêmio Molière e muitos outros pela produção e direção. Essa peça foi apresentada no Brasil e excursionou pela Europa. Naquele momento, as dificuldades comuns de um artista começaram a aparecer. que tipo de teatro poderiam fazer para se sustentar? Então, "viramos palhaços!", diz Silvia. A peça "Fala Palhaço!" estreou em junho de 1979. Como palhaços, falavam de crise, tanto a de integração como a de sobrevivência.

Em 1981, o Hombu começou a trabalhar um outro tipo de texto: poesia. O grupo produziu o espetáculo "Ou isto ou aquilo?", uma peça baseada na poesia de Cecília Meirelles. "Queríamos sair do hermetismo com que os poemas geralmente são ditos. Queríamos fazer de forma muito lúdica, com brincadeiras.



Escolhemos 24 poemas do livro, sem usar uma palavra nossa, interligados com um fio condutor: o ciclo da vida. A peça era delicada, surpreendente. As crianças e os adultos ficavam encantados".

Conversei com Silvia Aderne. Ela tem um jeito delicado, maternal na maneira de falar e de olhar para o mundo. Conheço o trabalho de Silvia há um bom tempo. E sempre prestei atenção no seu comportamento perante os outros – sua postura segura e um jeito emocionado de falar sobre o que ama: teatro.

Há quanto tempo você trabalha como atriz? Você já fez algum trabalho em televisão?

Desde 1963, quando comecei a trabalhar com o grupo Vento Forte, de Ilo Krueger e Pedro Domingues. Esse trabalho misturava a linguagem corporal do ator com a de bonecos. Era um trabalho bem diferente para a época. No palco, tínhamos cenários móveis, objetos inusitados, coisas que não eram comuns em uma peça de bonecos. Então, eu comecei com esse teatro de bonecos, atores e música no palco. Primeiro com o Vento Forte, e depois, em 1977, com o Hombu. Nunca trabalhei em TV.

Você foi primeiramente professora, e depois atriz, ambas as carreiras conviveram?

Sempre. Quando comecei a trabalhar como professora do estado, no Rio de Janeiro, eu passei a ser professora de artes.

Como o Cirque Du Soleil encontrou você?

Alice Viveiros de Castro – membro do conselho do grupo no Brasil – indicou-me para um teste. Ela me convidou, eu nunca pensei em trabalhar com eles. Mas, decidi fazer o teste, isso foi em outubro de 2004. E agora, eu vou para Montreal (Canadá) no próximo mês de setembro para um treinamento de 4 meses, e depois vou fazer a temporada, em Las Vegas, de um musical sobre os Beatles, em maio de 2006. Eu tenho dois anos de contrato com eles. Estou ansiosa, tudo isto é muito novo para mim.

Você é a única brasileira?

Não, existem 6 brasileiros no grupo. Um deles é a Teuda Bara, atriz do grupo Galpão, dizem que ela faz um trabalho extraordinário lá.

Quais são os próximos projetos do Hombu?

Estaremos no Teatro Maria Clara Machado (RJ), com a peça "Os diferentes", adaptada de textos de Carlos Drummond de Andrade, dirigida pelo Dudu Sandroni, com músicas de Beto Coimbra, Cristiano Motta e Ronaldo Motta, em outubro. Mas antes disso, teremos "A Zerotéia", no teatro do SESC Tijuca, em setembro.

Esta peça é de Hebert de Souza (Betinho) e dirigida pelo Ilo Krueger. O grupo também tem um projeto para outubro em várias unidades do Sesc, é um ciclo de leituras dramáticas dos textos de Guimarães Rosa, para jovens e adultos.

Durante sua carreira, você conviveu com crianças de diferentes épocas. Elas são diferentes?

Eu acho que a criança de hoje tem muito mais informação sobre tudo, são mais críticas do que as do meu tempo. Nós costumávamos ter acesso à coisas que as crianças de hoje não têm mais, por exemplo, viver mais perto da natureza, andar sozinho, explorar os exteriores. Mas a arte preenche tudo e nós não temos essa preocupação em trabalhar com tecnologia, pirotecnia, efeitos especiais. Nosso teatro é simples, nós queremos ser simples, as crianças precisam disso, das coisas simples que elas não experimentam mais. O teatro dá isso a elas.

Qual é a lição mais importante que o teatro ensina?

Tantas, mas eu posso dizer que é a arte da solidariedade. Para trabalhar em teatro é preciso ser solidário. É uma arte de muitas mãos. Tem o espírito coletivo como característica. Todos nós precisamos dos outros. A vida devia ser mais isso, mais coletiva, mais solidária, todos nós deveríamos estar sempre juntos.

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Agenda do HOMBU
"A Zerotéia", de Herbert de Souza(Betinho), direção de Ilo Krueger.
Teatro do Sesc Tijuca, de 3 a 25 de setembro de 2005.

"Os Diferentes", de Carlos Drummond de Andrade, adaptação do grupo Hombu e Dudu Sandroni, direção de Dudu Sandroni. Teatro Maria Clara Machado (Planetário da Gávea, RJ) - em outubro e novembro de 2005.

Leituras Dramáticas da obra de Guimarães Rosa para jovens e adultos, rede SESC Rio de Janeiro, em 4, 11, 25 e 26 de outubro de 2005.
Ver em http://www.sescrj.com.br


*Minha entrevista com Silvia Aderne foi em 15 de agosto de 2005 e foi publicada em setembro do mesmo ano em uma revista online americana, mas não está mais disponível. Para qualquer citação utilize a presente fonte. 

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